sábado, 3 de junho de 2017

resenha de fernando rocha, para o "oliveiras blues"


Oliveiras Blues, de Akira Yamasaki


A poesia de Akira é múltipla, se recusa a ficar presa em seu corpo, depois de extraída do seu ser, busca o outro, seja juntando-se a música dos Cabras de Baquirivu, banda responsável por musicar os poemas contidos em Oliveira blues, contando com a participação de outros amigos do universo da música para a gravação do cd ao vivo, quanto o teatro, por meio da encenação de Clóvis dedo mole, poema híbrido de narrativa e verso interpretado pelo coletivo Casa Amarela Encena.


Num possível diálogo com a famosa quadra de Sá-Carneiro (Perdi-me dentro de mimPorque era labirinto...), dentro de si pode não haver conforto, no poema Oliveira Blues 3, o fundador da estirpe dos baitas, perambulando na geografia íntima escreve: não sou mais o mesmo/ agora moro mais longe/ na periferia de mim.
Ao longo do livro, como nos chama a atenção o escritor João Caetano na apresentação, há a presença da figura pássaro e seu voo, desde o primeiro verso encontrado: voar aberto, contudo, outro espaço percorrido com as sensações transformadas em palavras, é o da infância: - quem assobia, akira/ não come semente, alquimia que transforma a dura lição paterna em verso.  
 No caminhar cronológico interno da obra, encontramos em 1960, uma lição biográfica na feitura do poema, tendo o plantio da melancia e sua colheita, como metáfora: todos os dias eu perguntava a ele (pai) se a minha melancia já estava no ponto e todos os dias ele respondia que ainda não, que estava verde ainda, que tenha paciência, akira, mas um dia não aguentei mais a curiosidade e a gula e com um canivete afiado talhei a bitela de cima a baixo...
Na poesia de Akira, o corpo é folha e as datas, fatos e sensações gravam na pele, como marca divisória de uma fratura no braço, que aponta a mudança no humor do menino que perdeu a capacidade de sorrir. Num salto dentro do tempo, o menino torna-se pai zeloso: filha, eu não quero/ que você caia e se machuque. Para o filho há: em alguma manhã/ dentro do seu sonho/ você corria sem dor/ e o seu sorriso dormia/ nos meus braços.
Parece que em alguns momentos, a poesia do homem que mescla um sorriso fácil com olhar de menino, desconhece a palavra como signo que possibilita a comunicação direta entre a sensibilidade do criador com o sentir do leitor: - era eu chorando alto/ em algum lugar bem fundo/ do silêncio de mim.
O poeta está dentro do cotidiano, os cenários de suas criações não são frutos do imaginário ou de uma observação distante, como o joalheiro esculpindo pedra preciosa, este senhor de ascendência japonesa, esculpe poesia do simples que há em nossos dias, flanando por cenários como botecos, padarias, ambientes de comunhão na periferia, locais onde se conversa sobre temas como o jogo de baralho, a partida de futebol, assuntos ressignificados, cumprindo um dos ideais de Manuel Bandeira: restabelecer a beleza do cotidiano.
Há artistas que têm sua obra ligada ao território onde residem, críticos dizem que os cineastas Ingmar Bergman e Win Wenders, quando produziram filmes em países estrangeiros, não conseguiram atingir os níveis de expressividade das obras criadas em seus países de origem, Akira é o homem que conecta a sua interioridade com o bairro onde vive, visceral, simples e direto como um acorde do velho ritmo norte americano.  


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